segunda-feira, maio 21, 2007

3º Festival de Cinema da Covilhã - O Capítulo Final (ou a constatação da existência do evento)

No último dia do Festival de cinema da Covilhã, lá consegui ver filmes (logo três)!

Devo dizer que não ocorreram, nesse dia, problemas de maior e que, feitas as contas finais, com maior divulgação, o evento teria sido de uma utilidade e importância extraordinárias, numa zona do país em que o cinema independente é repetidamente votado ao ostracismo...

Comecei a minha incursão no festival com a sessão das 18:00h e com um filme que já tinha visto e não me importo de rever quantas vezes forem... Estou a falar de "Play Time", realizado por Jacques Tati em 1967.

Tati, na minha opinião, pode ser analisado em dois quadrantes distintos.

Se, por um lado, o seu cinema é carregado de uma geometria perfeita no que diz respeito à composição dos planos, conferindo qualidade estética aos seus filmes; por outro, é o cineasta da comédia requintada. Fazendo uso da profundidade de campo e de alguns planos sequência, Tati consegue sempre mostrar pormenores preciosos. E não é um, nem dois, são muitos!

Lembro-me de ficar maravilhado quando vi "Mash" de Robert Altman pela primeira vez! Lembro-me de pensar para mim mesmo: "Incluir, num mesmo plano, várias situações simultâneas, com conversas simultâneas, é brilhante!"

Ora, Tati faz isto e muito mais! É genial!

Genial é também a personagem de Monsieur Hulot, interpretada pelo próprio Tati, neste, como em outros filmes. Incrível como, por vezes, Tati faz cinema mudo e a cores! Bem haja!

De resto, relativamente a "Play time", dizer apenas que este filme é uma dura crítica às sociedades cibernéticas e à globalização, muito embora, visto pelos olhos de um indivíduo do terceiro milénio, possa cheirar um pouco a "Velho-Restelismo"...

Acabada a sessão das 18:00h e descontado o intervalo para jantar, às 21:30 estava de novo no Teatro-Cine da Covilhã, desta feita para ver "Nuvem" de Gregor Schnitzler, realizado em 2006.

Confesso que quando li a sinopse do filme não me agradou muito a ideia de o ver e não o teria visto caso a sessão fosse à meia noite. No entanto, e uma vez que queria ver "Flirt" às 24:00h, decidi correr o risco.

O filme passa-se na Alemanha e tem como cenário um incidente numa central nuclear. A história centra-se no amor à primeira vista entre dois jovens, minutos antes do acidente.

Nada de novo aparentemente... Ou seja, quais os limites que um "click" nos pode impor e quais os esforços que podemos estar dispostos a fazer por um amor relativamente ao qual não temos provas, a não ser as que sentimos.

A primeira parte do filme está muito bem feita. A segunda metade está recheada de "clichés" e "lamechices", facto pelo qual não me agradou tanto.

O filme tem uma estética contemporânea, atestada pelo uso frequente da câmara em mão e, no enquadramento e sistematização do Festival, fez sentido a sua exibição antes de "Flirt".

Uma prespectiva ingénua do amor, que não deixa, apesar de tudo, de ser bonita e interessante.

Dizer ainda que o filme se pauta por uma certa dose de intervenção no que diz respeito à utilização de energia nuclear e aos acidentes que a mesma pode provocar.

O último filme deste dia de festival foi "Flirt", realizado por Hal Hartley em 1995.

Se, em "Nuvem", vimos o amor retratado de uma forma ingénua, em "Flirt" vemos exactamente o contrário, ou seja, uma prespectiva adulta e madura acerca das possibilidades de compromisso e dos medos que a essas possibilidades sempre estão adstritos.

Flirt é um tríptico composto por histórias sobre relacionamentos, dúvidas, apostas mal feitas, medos invariáveis, traições e compromissos.

A primeira história passa-se na América, a segunda na Alemanha e a terceira no Japão.

As histórias repetem-se, sendo que as duas primeiras são exactamente iguais, apenas mudando o cenário de fundo e a orientação sexual dos personagens.

Hartley constói uma equação. Um casal em que um dos personagens tem um caso com outro/a e em que esse outro/a também tem um relacionamento.

A última história, ligeiramente diferente das duas primeiras é, talvez, o decifrar da incógnita presente na equação e também o trecho do filme mais cuidado de um ponto de vista cinematográfico.

Passo a explicar. Hartley conta-nos histórias sobre o medo de assumir um compromisso, seja numa relação estável, seja num simples "flirt". No final dá-nos a entender que onde quer que exista medo o compromisso será sempre inviável.

É bonito o plano final e interessante do ponto de vista da significação. Curiosa aquela frase onde se pode ler "True Flirt"... E mais não digo, vejam o filme se puderem.

Para concluir, embora este filme seja um tanto ou quanto "freak" de um ponto de vista formal, vale bem a pena pela profundidade em que são explorados os personagens e pela densidade dos temas tratados.

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