sexta-feira, setembro 19, 2008

Já lá vão 40 anos, ou uma espécie de hommage...

“2001 Odisseia no Espaço” é o filme de ficção científica que, na minha opinião, mais se aproxima do conceito de humanidade e das questões que acerca dele se colocam, passando claramente a fronteira de um qualquer relato sobre criaturas bizarras que voam sobre pratos filmados em close-up...
Aliás, é esta a ideia habitual nos filmes de ficção científica – os marcianos, os discos voadores, as aterragens com fumo à volta, etc... Só que, de vez em quando, aparecem filmes assim..., mais densos, com menos bizarrias (ou, pelo menos, bizarrias não tão evidentes...). É a escola do “Blade Runner”, do “1984”, do “Metropolis”, das utopias negras, etc... Filmes mais profundos, mais cuidados, mais interessados em colocar questões à condição humana do que simplesmente aproveitar os medos e as pulsões que a mesma impõe... A bem da verdade, estes filmes deviam chamar-se de “filosofia ciêntífica”, embora não queira prender-me, por ora, nesta questão...

É fascinante a vertente da obra de Kubrick que se dedica à crítica ao funcionalismo. Seja neste 2001, como em “A Laranja Mecânica”, “Eyes Wide Shut” ou “Nascido para matar”, o que vemos é um esboçar de preocupações várias acerca da condição humana. O medo de sermos dominados por algo que criámos e nos escapou ao controle, a crítica às sociedades cibernéticas, ou aos possíveis modelos que daí possam advir, enfim, a ideia de que o homem se faz de humanidade e do que dela emerge, contrariando paradigmas científicos que vêm o homem como parte de uma grande máquina social, cujo único objectivo se direcciona à máxima produtividade...
Em 2001 plasma-se no ecrã uma epopeia, uma espécie de relato épico... Começamos por ter a imagem clara do que somos, filtrada pelas acções instintivas dos nossos antecedentes... Reparamos nas pequenas guerras que o homem trava por mero orgulho... Percebemos o conceito de poder, as teias que se alicerçam numa espécie de luta eterna... Quase que nos lembramos de um tal de Sam ("It’s still the same old story, a fight for love and glory"), não fosse a imagem de uns ossos partidos, com muito menos glamour que um qualquer piano de cauda... É disto que se fazem os bons filmes, penso..., das questões eternas!
Mais do que uma preocupação historicista, existe em “2001 Odisseia no Espaço” uma vontade de desenhar um modelo existencial, sintetizando o que é a essência do ser humano em pequenas parábolas, espelhadas em acasos primordiais. A tal elipse, aquela de que se falou em “Goodbye Lenin” e que tem sido admirada por todo esse mundo cinéfilo, é a síntese perfeita, apenas ao alcance de um génio... A ideia de que o motor da evolução é a luta pelo poder e que a mesma tem que ser travada com muitas cautelas... Incrível como um osso atirado ao ar, desferido ao acaso, rumando ao infinito por entre a melodia do Danúbio Azul, pode mimetizar o axioma supremo e explicar, com alguma abstracção, todas as pequenas histórias que se fizeram nessa história maior a que temos o hábito de chamar humanidade...
A “máquina” não para em “2001”... Partem-se ossos, aprende-se o “poder” e logo estamos no espaço!

Acho menos interessante a ideia final do filme do que o ponto de onde partiu... Estamos em 2008, somos gente diferente do que aquela que viu o filme pela primeira vez em 1968... Flando muito francamente, não conheço muita gente que, no mundo de hoje, perca mais tempo a pensar sobre a hipótese de podermos ser detruídos por algo que criámos do que sobre o modelo de ar condicionado que convém ao refrecar da sala de estar... Já não vivemos a guerra fria, já não sabemos sequer o que é a hipótese de partir para um país que desconhecemos com uma arma na mão e uma lata de atum na outra... Somos hoje pessoas gobais que vivem num mundo global, em que o dinheiro já não é feito de metal ou até de papel... Sabemos, no entanto, que somos infinitos em ideias e finitos em possibilidades... Daí a actualidade deste filme..., actualidade invulgar e intemporal!
É verdade que o Hall 9000 já não consegue assustar este homem contemporâneo livre da ideia de pecado, mas é também verdade que devemos pensar nele de vez em quando, que devemos lembrar... E aí “2001 Odisseia no Espaço” cumpre e cumprirá sempre o seu papel!

2 comentários:

P.R disse...

Quando puderes vai ao teu email. ;)

Ursdens disse...

já lá fui!

:)