segunda-feira, janeiro 22, 2007

Páginas de diário cinéfilo

Este post vai ser qualquer coisa como um "balanço da semana", "cinefilamente" falando, claro está! Comecei a semana cinéfila na terça feira, com o magnífico "Une Femme est une Femme" de Jean-Luc Godard. Já não o via há algum tempo. Deu-me p'ra coisa...
É um filme que faz lembrar os musicais americanos, mas em que a câmara gira quase ao sabor do vento e a acção se vai desenrolando como que por magia... Godard é um ilusionista, um trapezista, vôa sempre bem alto!
Neste filme vemos mais uma vez as "mulheres de Godard", ainda que só tenhamos Anna Karina... Aquele paradigma da mulher de Godard, que poderia ser Karina, como Seberg, como Bardot, mas sempre com uma aura indelével, a que nos habituou nos primeiros filmes da sua carreira. Acima de tudo, como matriz autoral de Godard, parcialmente diga-se, poder-se-á apontar uma certa e determinada visão da mulher, com os seus dramas irresolúveis, mas também um encanto constante... Próximo de Truffaut neste aspecto.
Encontra-se também, neste, como em outros filmes de Godard, uma certa arbitrariedade patente no enredo, mas à qual parece corresponder um desfecho mais ou menos determinado ou determinista, como se quiser...
Enfim, isto serão desconstruções, mais valerá porventura dizer que "Une femme est une femme" é uma delícia!, tão ligeiro e tão denso que quase não nos apercebemos de o filme ter começado ou terminado... Uma pérola da "Nouvelle Vague"!
Na quinta vi o "Scoop", o novo filme de Woddy Allen, que tem dividido opiniões, embora se consensualize que é uma filme mais esquivo em Allen, com menos preocupações.
Muitos há a dizer que o filme vive de Scarlett Johansson. Muito pessoalmente, não concordo. Não é que me desagrade ver Scarlett na tela, antes pelo contrário..., mas não me parece que tenha feito a diferença neste "Scoop". O filme vive, sim, de Woddy Allen e da frenética postura a que sempre habituou o público. É impossível não rir... O homem fala demasiado rápido, faz constantes piadas inteligentes que ridicularizam as suas personagens, é por excelência, o anti-herói... É sempre Judeu, é sempre psicóticamente estúpido, é sempre Woody, o que basta para que os seus filmes mereçam ser vistos.
Pese embora a inevitabilidade de Woddy Allen, parece-me, porém, que "Scoop" é um filme menor, menos conseguido, o que nada choca, tendo em conta a obra de Allen, sempre pautada por uma sucessão de filmes em que, uns vão sendo melhores e outros piores. Afinal de contas, difícil seria fazer um filme por ano em que cada um fosse melhor que o outro...
De qualquer forma, o conselho que daria a Woddy Allen seria o de pôr de parte Scarlett, acho que lhe anda a toldar as ideias... eheh
Sexta-feira foi tempo de "Novo Cinema Americano", "sui generis", diga-se. Vi o, já clássico, de Jonh Cassavetes, "A Woman Under the Influence", realizado em 1974.
O filme retrata a história de um casal, Nick e Mabel, e dos seus três filhos, amigos e familiares. Mabel tem problemas mentais, bipolaridade, pareceu-me, e consome a sua vida com os filhos e com a espera de que o marido venha do trabalho. Mabel é desorientada, vive num estado de ansiedade constante.
O filme em si é um excelente retrato da doença bipolar e dos problemas que pode trazer à vida de uma família.
Gostei muito do trabalho de câmara e da selecção dos planos. A interpretação de Gena Rowlands, no papel de Mabel, é estonteante.
Ainda assim, não é para mim, a obra-prima de que se vai falando, quiçá por ser um filme já datado, que aborda problemas corriqueiros aos olhos do espectador dos dias que correm.
Ontem fui à Gulbenkian ver "Através das Oliveiras" de Abbas Kiarostami. Em primeiro lugar, devo dizer que acho vergonhosa a realização de um ciclo de cinema daquela envergadura com condições sonoras tão depauperantes para os próprios filmes que lá são exibidos... Meu rico Quarteto! Antes uma coluna a arranhar e o som das salas do lado a ouvir-se, do que o som parecer, mais o efeito de um pedal "flanger" para guitarra eléctrica, que qualquer outra coisa... A dada altura, perguntei a mim mesmo se aquilo seria o visionamento de um filme ou um conceito inovador chamado "visionamento fílmico com instalação sonora"... enfim, é o estado em que se vai vivendo neste país...

Quanto ao filme em si, diga-se que apenas vi, antes deste "Através das Oliveiras", dois filmes de Kiarostami: "O Sabor da Cereja" e "Ten". Entendo a inovação que o seu cinema possa trazer à linguagem cinematográfica, entendo a perspectiva, se quisermos, neo-neo-realista, em que os acontecimentos se produzem como seriam, em que a realização é uma quase impressão da realidade e a mimetiza, em que se abole a iluminação artificial e quase se esbate a banda sonora, com planos sequência que alastram por sítios onde existem pessoas "reais", com histórias "reais". As histórias de Kiarostami são contadas de uma forma paciente, pausada e focada em elementos casuais. O espectador é, de facto, "livre" perante os seus filmes, não sendo, significativamente, manietado...
Ainda assim, embora tenha gostado de "O Sabor da Cereja" e de "Ten", "Através das Oliveiras" não teve grande impacto em mim. Talvez por não ter ainda visto "Onde fica a casa do meu amigo" e "A vida continua", os dois filmes que o precedem na trilogia, admito...,pese embora a história de "Através das Oliveiras" não me ter cativado.
Achei bonito o plano final do filme, achei interessante a ideia da dialética real/fílmico, concretizada nos planos das escadas e da varanda (é sempre interessante ver o cinema a falar de cinema), achei graça à personagem de Hossein, gostei da serenidade das paisagens e do escorrer do tempo por entre as oliveiras, mas foi serenidade a mais, sem o brilho encontrado em "O Sabor da Cereja".

E assim foi a minha semana de cinema...

3 comentários:

Hugo disse...

Eu diria que foi uma bela semana de Cinema :-)

peter killer disse...

boa boa!! acho que sim.. Godard é sp godard e as mulheres do godard são sp idílicas!! scoop pra mim não é um filme menor é realmente um filme mau, direi mesmo que é o pior de woody allen a par com a poderosa afrodite e talvez o bananas. kiarostami é sp capaz do melhor e do pior e em relação a cassavetes, como já te tinha dito, desconheço por inteiro a obra, é um daqueles que está em lista de espera..

a minha semana foi um pouco diferente.. começou com o tão odiado scoop em seguida vi o professione reporter do antonioni o la caduta degli dei do visconti (dois filmes belíssimos) passei pelos três enterros de melquiades estrada (uma surpresa bastante agradável de tommy lee jones) e acabei há bocado de ver o alice que amei profundamente..
Ou seja temos imenso pra debater,mas depois pomos a conversa em dia.. fica bem

Ursdens disse...

Pedro: Vamos sair na sexta e pomos a conversa em dia! :D