quarta-feira, janeiro 31, 2007

O que se tem feito

Já não ia à cinemateca há um ano ou dois. Estive lá ontem por volta das 19:30h para comprar bilhetes para o "Roma Cidade Aberta", cuja sessão seria às 21:30h. Para meu desgosto já não havia bilhetes... Por um lado fiquei um bocado chateado, por outro, acho muito bom que se vá ao cinema e que as salas esgotem!

Não tem havido grande pachorra para escrever sobre cinema, daí deixar apenas estas pequenas considerações. Daqui a pouco vou ver um filme. Talvez o "Annie Hall", talvez o "The Graduate"... Ando com vontade de rever... rever é sempre bom... quase melhor que ver...

quinta-feira, janeiro 25, 2007

Peeping Tom

"Peeping Tom" foi realizado por Michael Powell em 1960. Na época foi um filme mal amado, de tal forma que quase destruiu a carreira do realizador. Alguns anos mais tarde, porém, Martin Scorsese ressuscitou-o no Festival de cinema de Nova York, promovendo sessões do filme e restauro das películas. Não é, ao acaso, que este se tornou um filme de referência para Scorsese e para De Palma, entre outros.

O filme é um thriller, que narra a história de um operador de câmara, Mark, atormentado por traumas de infância. Desde miúdo que o seu pai, um médico, fazia estudos sobre o medo e o efeito que este poderia causar nas pessoas. No âmbito de tais estudos Mark foi várias vezes usado como cobaia, interiorizando uma patologia voyeurista. O pai costumava filmá-lo em inúmeras situações, ao ponto de, na sua maior obra, um compêndio científico sobre o medo, Mark figurar nos agradecimentos como alguém sem o qual o livro nunca teria sido escrito.
Mark tem todo o espírito de fotógrafo, parecendo querer "roubar" as imagens que vai encontrando. Mas, no meio de toda essa sensibilidade, tornar-se-á um "serial killer", tendo como objectivo último filmar a cara de uma pessoa enquanto morre e olha para si própria. É pelo medo que Mark se interessa, tentando fazer a experiência derradeira, em que ele próprio protagonizará um papel.
Não será difícil adivinhar a razão porque o filme foi repudiado na época. É demasiado perturbador, demasiado doentio... Para quem, no dias que correm, já levou com uma série de blockbusters sobre assassinos em série, versando patologias que, por vezes nem existem, a temática do filme será, quiçá, corriqueira. No entanto, a complexidade psicológica entre a qual o filme está intrincado é de uma densidade tremenda. A personagem de Mrs. Stephens está muito bem construída, aproveitando-se muito bem a ideia de que apenas ela conseguiu ter um vislubre do que se passaria com Mark, ainda que sendo cega. Por tudo isto, a obra prima de Powell perdura. É um filme extremamente bem feito, meticuloso. A selecção dos planos é brilhante, com uma sequência inicial, em que o plano é definido dentro de uma câmara, que arrebata o espectador desde início. A montagem do filme é perfeita, tal o efeito que os raccords imprimem na atenção do espectador. É por estas e por outras que Scorsese terá afirmado que há dois filmes que têm tudo o que pode ser dito acerca da realização, "Otto e mezzo" de Fellini e este "Peeping Tom".

terça-feira, janeiro 23, 2007

Body Rice

"Body rice" é um filme que me tinha criado alguma ansiedade em ir ver, não porque me trouxesse expectativas, mas tão só porque, de tudo o que tinha lido sobre ele, imaginava uma experiência extremamente bizarra e por isso necessária. Sendo assim, foi ontem o dia de fazer a experiência!

Tudo começou quando, ao abrir a página online de cinema do público, me deparei com um texto cujo título era "o freak é chique", da autoria de Inês Nadais. Ora, "o freak é chique" é no mínimo intrigante, vai daí pûs-me a ler o belo do texto.

Concluí na altura que o realizador Hugo Vieira da Silva tinha querido fazer um filme "Wharholiano", mais baseado na performance e na atitude da câmara perante o corpo e vice-versa. Hugo Vieira da Silva desmentia o epíteto de "filme sobre freaks" e focava a sua atenção numa perspectiva mais plástica e estética da obra.

Dizia: "(...) o meu cinema é performativo: não me interessa ir para o set improvisar e apanhar coisas com a câmara, interessa-me esse lado laboratorial antes do filme. A performance é aquele momento, o filme é outra coisa: há um efeito modificador na imagem e na montagem. Interessa-me trabalhar no cinema, ainda que pondo o cinema em causa. (...)"

Por sua vez, Inês Nadais ironizava um tanto ou quanto, quase rindo do facto de o realizador desmentir ser este um filme sobre freaks e charros e música tecno e alentejo e alcóol e cães, etc. ...
Devo dizer que não desgostei de "Body Rice". Não é propriamente o meu género de cinema, mas não me maçou. Achei-o inclusivé uma experiência sinestésica de grande valor, teve por isso a capacidade de me hipnotisar por alguns momentos.

Há, no entanto, coisas que não compreendo em Hugo Vieira da Silva. Não percebo como pode querer fazer cinema performativo com uma base narrativa, não entendo como pode incluir no filme esta mesma base desprezando-a e menosprezando-a.

Há história em "Body Rice". Este não é um filme à Paul Morrissey, ou à Andy Warhol (caso queiram atribuir a autoria a esse proxeneta intelectualmente diminuído...). É um filme partido, sim, fragmentado, que vive, pura e simplesmente, de instantes, de situações...

Não vejo grande mérito na perspectiva performativa perfilhada pelo realizador. "Lado laboratorial" no filme existe sempre. Chama-se "mise en scène" e conduz inevitavelmente à performance. A questão é que, normalmente essa performance, no cinema narrativo, serve para contar uma história, enquanto que no cinema não-narrativo existe "per si". Se é uma questão conceptual que o realizador quis atingir, ou seja, fazer um filme narrativo com uma componente performativa que tenha existência própria e autónoma, tudo bem... Não consigo é vislumbrar mérito nisso, como também não o vislumbro na obra de Paul Morrissey. Não gosto de cinema experimental, por norma, tenho tendência a encontar nele apenas pormenores interessantes, tão só.

Body Rice é um filme sobre freaks, disso não haja dúvidas... Tudo o que diz respeito ao típico "freaky livestile" está lá retratado. Desde o amor ao cão, passando pelo charro constante, pelo desnorte existencial, pelas raves em que se dança interminavelmente sob o efeito de batidas electrónicas psicadélicas (ou de químicos, conforme a perspectiva...). É um filme sobre pessoas que perderam o fio de prumo das suas vidas e "foram", "deixaram-se ir"... Não recrimino a atitude, muito francamente até a louvo, tal a coragem que encerra.

É também um filme sobre "freaks exilados", aqueles que se viram obrigados a, no final dos anos 80, virem para Portugal em programas de reabilitação social, oriundos da Alemanha.

Não é um filme que mostre uma realidade desconhecida, pelo menos para os mais informados. Comunidades há-as em muitos sítios, de norte a sul do país. Há inclusivamente aldeias de freaks!, veja-se. Logo não é também por aí que o filme possa ter grande interesse...

O que gostei em "Body Rice" foi da sensibilidade. Da dinâmica que as imagens de Hugo Vieira da Silva imprimiram naquele "modo de vida", naquele despojar de tudo. Da contemplação da alienação "per si", capaz de, assim apresentada, explicar o seu fundamento aos mais atentos... É, por isso, um filme que, tenha o realizador querido ou não, serve de base a uma reflexão sobre os "freaks" e a "freakalhada"...
Acrescento apenas que gostei muito da fotografia e, especialmente, da banda sonora, fora os trechos psicadélicos...

segunda-feira, janeiro 22, 2007

Páginas de diário cinéfilo

Este post vai ser qualquer coisa como um "balanço da semana", "cinefilamente" falando, claro está! Comecei a semana cinéfila na terça feira, com o magnífico "Une Femme est une Femme" de Jean-Luc Godard. Já não o via há algum tempo. Deu-me p'ra coisa...
É um filme que faz lembrar os musicais americanos, mas em que a câmara gira quase ao sabor do vento e a acção se vai desenrolando como que por magia... Godard é um ilusionista, um trapezista, vôa sempre bem alto!
Neste filme vemos mais uma vez as "mulheres de Godard", ainda que só tenhamos Anna Karina... Aquele paradigma da mulher de Godard, que poderia ser Karina, como Seberg, como Bardot, mas sempre com uma aura indelével, a que nos habituou nos primeiros filmes da sua carreira. Acima de tudo, como matriz autoral de Godard, parcialmente diga-se, poder-se-á apontar uma certa e determinada visão da mulher, com os seus dramas irresolúveis, mas também um encanto constante... Próximo de Truffaut neste aspecto.
Encontra-se também, neste, como em outros filmes de Godard, uma certa arbitrariedade patente no enredo, mas à qual parece corresponder um desfecho mais ou menos determinado ou determinista, como se quiser...
Enfim, isto serão desconstruções, mais valerá porventura dizer que "Une femme est une femme" é uma delícia!, tão ligeiro e tão denso que quase não nos apercebemos de o filme ter começado ou terminado... Uma pérola da "Nouvelle Vague"!
Na quinta vi o "Scoop", o novo filme de Woddy Allen, que tem dividido opiniões, embora se consensualize que é uma filme mais esquivo em Allen, com menos preocupações.
Muitos há a dizer que o filme vive de Scarlett Johansson. Muito pessoalmente, não concordo. Não é que me desagrade ver Scarlett na tela, antes pelo contrário..., mas não me parece que tenha feito a diferença neste "Scoop". O filme vive, sim, de Woddy Allen e da frenética postura a que sempre habituou o público. É impossível não rir... O homem fala demasiado rápido, faz constantes piadas inteligentes que ridicularizam as suas personagens, é por excelência, o anti-herói... É sempre Judeu, é sempre psicóticamente estúpido, é sempre Woody, o que basta para que os seus filmes mereçam ser vistos.
Pese embora a inevitabilidade de Woddy Allen, parece-me, porém, que "Scoop" é um filme menor, menos conseguido, o que nada choca, tendo em conta a obra de Allen, sempre pautada por uma sucessão de filmes em que, uns vão sendo melhores e outros piores. Afinal de contas, difícil seria fazer um filme por ano em que cada um fosse melhor que o outro...
De qualquer forma, o conselho que daria a Woddy Allen seria o de pôr de parte Scarlett, acho que lhe anda a toldar as ideias... eheh
Sexta-feira foi tempo de "Novo Cinema Americano", "sui generis", diga-se. Vi o, já clássico, de Jonh Cassavetes, "A Woman Under the Influence", realizado em 1974.
O filme retrata a história de um casal, Nick e Mabel, e dos seus três filhos, amigos e familiares. Mabel tem problemas mentais, bipolaridade, pareceu-me, e consome a sua vida com os filhos e com a espera de que o marido venha do trabalho. Mabel é desorientada, vive num estado de ansiedade constante.
O filme em si é um excelente retrato da doença bipolar e dos problemas que pode trazer à vida de uma família.
Gostei muito do trabalho de câmara e da selecção dos planos. A interpretação de Gena Rowlands, no papel de Mabel, é estonteante.
Ainda assim, não é para mim, a obra-prima de que se vai falando, quiçá por ser um filme já datado, que aborda problemas corriqueiros aos olhos do espectador dos dias que correm.
Ontem fui à Gulbenkian ver "Através das Oliveiras" de Abbas Kiarostami. Em primeiro lugar, devo dizer que acho vergonhosa a realização de um ciclo de cinema daquela envergadura com condições sonoras tão depauperantes para os próprios filmes que lá são exibidos... Meu rico Quarteto! Antes uma coluna a arranhar e o som das salas do lado a ouvir-se, do que o som parecer, mais o efeito de um pedal "flanger" para guitarra eléctrica, que qualquer outra coisa... A dada altura, perguntei a mim mesmo se aquilo seria o visionamento de um filme ou um conceito inovador chamado "visionamento fílmico com instalação sonora"... enfim, é o estado em que se vai vivendo neste país...

Quanto ao filme em si, diga-se que apenas vi, antes deste "Através das Oliveiras", dois filmes de Kiarostami: "O Sabor da Cereja" e "Ten". Entendo a inovação que o seu cinema possa trazer à linguagem cinematográfica, entendo a perspectiva, se quisermos, neo-neo-realista, em que os acontecimentos se produzem como seriam, em que a realização é uma quase impressão da realidade e a mimetiza, em que se abole a iluminação artificial e quase se esbate a banda sonora, com planos sequência que alastram por sítios onde existem pessoas "reais", com histórias "reais". As histórias de Kiarostami são contadas de uma forma paciente, pausada e focada em elementos casuais. O espectador é, de facto, "livre" perante os seus filmes, não sendo, significativamente, manietado...
Ainda assim, embora tenha gostado de "O Sabor da Cereja" e de "Ten", "Através das Oliveiras" não teve grande impacto em mim. Talvez por não ter ainda visto "Onde fica a casa do meu amigo" e "A vida continua", os dois filmes que o precedem na trilogia, admito...,pese embora a história de "Através das Oliveiras" não me ter cativado.
Achei bonito o plano final do filme, achei interessante a ideia da dialética real/fílmico, concretizada nos planos das escadas e da varanda (é sempre interessante ver o cinema a falar de cinema), achei graça à personagem de Hossein, gostei da serenidade das paisagens e do escorrer do tempo por entre as oliveiras, mas foi serenidade a mais, sem o brilho encontrado em "O Sabor da Cereja".

E assim foi a minha semana de cinema...

quarta-feira, janeiro 17, 2007

Ainda sobre o Lost in Translation e a Sofia Coppola e a dificuldade de comunicação e o Babel se calhar...

Durante a quadra natalícia, como é habitual, vi alguns filmes. Nessa altura, quando não me aparece lá tudo em casa e se acaba a ver um filme estúpido qualquer, costuma haver tempo para rever umas coisas. Este foi, assim, o terceiro Natal consecutivo no qual partilhei alguns momentos com o "Lost in Translation" (já começa a tornar-se um vício...).

É um filme do qual se vai continuando a falar... Ou por ser considerado obra prima, ou por ser considerado simplista e inócuo, ou por ser, pura e simplesmente, o filme mais conhecido daquela tipa que é filha de um gajo muito fixe que até fez os padrinhos e aquele da guerra em que o Marlon Brando é meio doido...

Referi-me a ele há uns tempos a propósito de "Babel". Disse na altura que, em "Babel", vi um pouco de "Lost in Translation".

Sobre as bizarrias nipónicas, disse-me alguém, que elas eram mostradas em "Lost in Translation" como uma espécie de "vejam tão diferentes que eles são"... E nisto pûs-me a pensar se haveria alguma relação a estabelecer com "Babel" neste aspecto. Muito francamente penso agora que não..., pelo menos quanto à questão central em "Babel".

Disseram-me também que não existe piada nenhuma em retratar a degradação do sonho desfeito de recém casados e o vazio da falta de compreensão entre casados de há muitos anos... Que, em "Lost in Translation", se vê uma realidade há muito conhecida, apresentada como um cliché...

E nisto pûs-me a pensar sobre o assunto, dizia eu...

Lost in Translation é um filme diferente... Diferente, em primeiro lugar, por ser escrito e realizado por uma mulher, coisa nada habitual em filmes com tanto impacto. Diferente por ter sensibilidade feminina estampada em cada plano, por ter essa sensibilidade feminina impressa no argumento, por juntar a isto tudo uma envolvência criada pela fotografia e pela banda sonora, ambas extasiantes...
Mas sobre o que fala "Lost in Translation"?

-Sobre as dificuldades de comunicação? Naturalmente..., mas acessoriamente também...

-Sobre as diferenças entre orientais e ocidentais? Claro que sim, mas mais uma vez apenas como complemento a uma questão muito maior...

"Lost in Translation" fala da desorientação..., da inadaptação..., do não tocar, do não conseguir ser tocado/a... E fá-lo sempre com uma frescura harmónica, sem que o filme se torne claustrofóbico.

Ao fim e ao cabo, fala-nos dos nossos limites, das nossas possibilidades..., do vazio que se sente uma vez por outra, da coragem que se pode ter para o combater... O cinema de Sofia Coppola é aliás, até à data, um cinema da inadaptação, seja em "As virgens suicidas" ou em "Marie Antoinette", como em "Lost in Translation".

Há alturas no filme, mesmo antes de os personagens estarem definidos, em que sabemos logo que aquela mulher "está lá mas não está" e que aquele homem "não sabe bem onde está"... Seja pelos longos planos de Scarlett na janela do hotel, seja pelas bizarrias da realização de um anúncio... passando pelo copo que deveria ter whisky e, em vez disso, tem ice-tea... Nada bate certo aparentemente... Bob e Charlotte têm precisamente tudo o que não queriam ter e faz-lhes falta tudo o resto. Encontram-se, partilham e partem... É aí que vejo a mestria de Sofia Coppola, é em contar uma história descrevendo meros ambientes, em significar por mero uso do plano, como se os momentos de silêncio fossem os mais importantes e mais carregados de significação em todo o filme.

Se, pelo filme a dentro, nos vão dando histórias bizarras ou diferentes é porque, daí, Sofia Coppola quis extrair elementos coadjuvantes a um de três conceitos: quer a inadaptação, quer o vazio, quer a esperança de um qualquer devir...
No final não sabemos nada sobre Charlotte e Bob. Não sabemos se ficam juntos, se não, não sabemos se deixarão as vidas que levam, não sabemos sequer se encontraram a solução para o vazio que sentiam... Sabemos apenas que tentaram, que sonharam e, estejam ou não os problemas resolvidos, fiquem ou não juntos, esse sonho valeu a pena...

Ora, e concluindo, "Lost in Translation" é um filme aparentemente banal, que apenas não o é por falar de certas e determinadas coisas banalmente... neste caso o fácil seria dramatizar...

quinta-feira, janeiro 11, 2007

Almodóvar e o Cinema Quarteto

Anteontem fui ver o "Volver" ao Cinema Quarteto. Do filme direi apenas que Almodóvar adquiriu, desde há uns anos para cá, uma grave patalogia: Não consegue fazer mau cinema... O seu cinema é forte, estilizado, cheio de cores fortes, tanto na tela como nos argumentos. É o realizador do kitsch por excelência, um dadaísta "tímido", capaz de um humor que, de tão absurdo que é, se torna cáustico...

O preço a pagar por tamanha "subversão estética" é o de que não lhe conheço nenhuma obra prima... Faz filmes com muita qualidade, muito agradáveis, com argumentos poderosíssimos e composições cénicas primorosas, mas a toada é sempre a mesma. Almodóvar paga, se calhar, o preço de ter personalidade, de ser "Almodóvar"...
"Volver" é por isso, para mim, mais um filme de Almodóvar..., tão só... não que isto seja negativo, entenda-se.
Gosto do drama como género, se é que se pode falar em géneros no que diz respeito a um "certo cinema". E é aí que Almodóvar brilha, para lá de desvarios iniciais relacionados com "presuntos" e afins e desconstruções cómicas momentâneas como "Átame" ou "Mulheres à beira de um ataque de nervos". No drama, Almodóvar torna-se Almodóvar... Congrega todos os elementos do seu cinema; tanto os desvarios absurdos, crús ou não, como o sarcasmo malicioso-inofensivo, até aos ambientes grutescos, de uma espécie de "romantização" feita, artificialmente, para parecer artificial... Apenas uma excepção no que a esta ideia diz respeito: "A Má Educação", que a dada altura esteve mais próximo do cinema de Tornatore do que do habitual frenesi de Almodóvar.

É no drama que Almodóvar estampa "Tudo sobre a minha mãe", "Hable con Ella", "Carne trémula", "A flor do meu segredo" e este mais recente "Volver". Bem haja!


Mas, dizia eu, anteontem fui ver o "Volver" ao cinema Quarteto. Há muito tempo que lá não ia, talvez desde a maratona de filmes que comemorou os 25 anos da existência do cinema, em que estive à porta e por lá fiquei porque já não arranjei bilhete...

Confesso que tinha algumas saudades... Era um cinema ao qual ia muitas vezes com os meus pais, quando vinha a Lisboa. Foi por lá que eles algumas vezes namoraram enquanto por cá andavam, dizem-me, e nunca perderam o gosto em lá ir. Lembro-me de ir ver ao Quarteto o "Indiana Jones e a última cruzada", era eu ainda pirralho... Lembro-me de ver lá o "The Rainmaker" do Coppola, "O último Imperador" do Bertolucci e muitos mais... Gostei de lá voltar!

Aquele cinema tem um toque de glamour decadente... As escadarias estreitas recheadas de posters "vintage", as cadeiras vermelhas maltratadas, os quadrados em alto relevo nas paredes das salas...
Hoje vêm-se lá filmes baratos, mais caros que na cinamateca, mas também mais recentes... Quatro euros imagine-se..., três se houver cartão jovem... Há intervalo e ainda se ouve aquele som intermitente da chamada das pessoas à sala. Escolhemos o lugar, não há pipocas, não se faz barulho... fabuloso!

Muito cinema de autor é lá projectado, cerca de um mês depois de já não estar em exibição no circuito comercial. Só tenho pena que as películas, como já foram muito rodadas, não estejam em grande estado...

Quando saí do cinema, estava o átrio com um ambiente deserto, mas aconchegante. Era para aí meia noite, embora o bar ainda estivesse aberto. Não havia ninguém a não ser eu, um amigo que comigo tinha ido, o Manel, e a empregada do bar. Encostámo-nos ao balcão porque ele queria tomar um café. Durante a tarde tinha estado a ouvir o "These Foolish Things" cantado pela Ella Fitzgerald. Olhei para o balcão e, ao reparar no cinzeiro, vejo lá uma beata enorme, cheia de marcas de bâton... "a cigarette that bares a lipstick's traces...". Reapaixonei-me pelo Quarteto... Que vivas muitos anos nesse teu glamour decadente!

segunda-feira, janeiro 08, 2007

Babel

Só hoje tive tempo para ir ver "Babel", o último filme de Alejandro González Iñárritu, que encerra a "Trilogia da Vida" iniciada em "Amor Cão" e continuada em "21 Gramas".
Babel é, formalmente, um conjunto de histórias encadeadas entre si, como já o tinham sido os dois predecessores. Iñárritu usa pequenos instantes para deles fazer uma sinapse coerente e capaz de transformar o modo de "contar um filme". Talvez, deste ponto de vista formal, possamos ver em Iñárritu um continuador de Altman ou Paul Thomas Anderson, mas não nos deixemos levar pelo deslumbre, porque uma trilogia não faz uma obra. Teremos que esperar, porventura, mais longas metragens de Iñárritu para que o autor se defina.

Babel inicia-se com as paisagens do deserto marroquino, onde duas crianças de um mundo rural têm o primeiro contacto com as armas. Daí a que estejamos perante a história de uma ama mexicana e dois miúdos ocidentais, de um casal de turistas em que a mulher está à beira da morte, ou de uma miúda japonesa com os seus traumas de adolescente, pouco vai, por entre um sem número de elipses extremamente bem conseguidas. De facto, é nisso, para lá da fotografia, que Iñárritu se destaca. Não haja dúvidas de que o homem sabe montar...

Este é um filme sobre a comunicação ou a falta dela... no casal (Pitt e Blanchett), nos povos (as tensões diplomáticas entre o governo marroquino e o americano), nos pais e nos filhos (a menina oriental e o seu pai), nas relações entre as autoridades e os cidadãos (a ama mexicana ou o pastor marroquino e os seus filhos), no amor (a menina oriental novamente)... Engraçado como, desabrochando a vida comunitária na sociedade globalizada dos dias que correm, não chegue o inglês para que todos se percebam...

A dada altura, e principalmente na história passada a oriente, têm-se uma sensação de "Lost in Translation", quer pelos magníficos palnos de arranha-céus, com que, aliás, o filme acaba, quer com as bizarrias da cultura nipónica.

Vi também um pouco de "American Beauty" na relação entre a menina oriental e o polícia, senão um quase plágio.

Gostei do silêncio e da forma como Iñárritu o usou. Lembrei-me do final de "Os 400 Golpes" de Truffaut, embora em "Babel" me pareça que este é usado de uma outra forma, muito mais conceptual.

Mas, como nem tudo são rosas, houve, na minha opinião, algo que faltou em "Babel". Talvez por estar à espera do "filme do ano", como por muitos fora empolado, talvez por, comparado com "Amor Cão", não passar de um filme engraçado (tal como "21 Gramas" já o tinha sido), ou talvez ainda por já não se poder ver um filme no Cinema Monumental em silêncio...

De qualquer forma fica o registo. Gostei, vale a pena, mas não é uma obra prima...

quinta-feira, janeiro 04, 2007

2007

Em primeiro lugar, as minhas desculpas por o blog ter andado parado durante uns dias. Natal, ano novo, enfim..., há outras prioridades em certas situações...

De resto, esperemos que se continue a fazer bom cinema, não tenhamos nós que desencantar constantemente uma qualquer película perdida neste e noutros "sótãos"...

Vai daí, pûs-me a procurar estreias para este ano que agora começou e descobri algumas coisas que me despertaram a curiosidade.
Aí vão elas:

Coeurs (Alain Resnais)



Dear Wendy (Thomas Vinterberg)



Direktøren for det hele (Lars Von Trier)



Inland Empire (David Lynch)



Goya's Gosts (Milos Forman)



Letters from Iwo Jima (Clint Eastwood)



Scoop (Woody Allen)




Sunshine (Danny Boyle)

The fountain (Darren Aronofsky)


The Good German (Steven Soderbergh)


Youth without youth (Francis Ford Coppola)